domingo, 10 de maio de 2015

Maternidade


Hoje meditando sobre meu pouco entusiasmo por datas comemorativas, percebo que isso é mais uma das inúmeras qualificações que preenchem minha ficha para possível alienígena, vivendo inconscientemente no planeta Terra. Esqueço datas de aniversários de pessoas importantes, inclusive o meu. Lembro que numa época "remota", ainda na infância, costumava contar os dias e até os meses pra ficar finalmente um ano mais velha. Não tínhamos o costume de festas, lá em casa...outros tempos! Saudosas e simples comemorações caseiras, que de dez em dez anos eventualmente aconteciam. Mas claro, eu esperava ansiosa pelos presentes, acertadamente um do meu amoroso pai.

Daí os anos foram passando, a ponto de um ano a mais representar já um peso incômodo, um após o outro numa velocidade incrível! E até os presentes foram perdendo o encanto, as máscaras já caídas, alguns bons valores estabelecidos, os maus valores sendo rasgados aos poucos... O tempo foi me fazendo entender algumas coisas importantes sobre 'datas comemorativas'. Uma delas: presentes são obrigações que custam caro, representam uma conta a mais no cartão de crédito, um item a mais dentro do guarda-roupa, muitas vezes sem uso, mofando numa gaveta, pra justificar um padrão de ética útil apenas para o dono da loja que o vendeu. E a outra coisa que aprendi sobre datas comemorativas? Porque comemorar uma data? Porque comemorar apenas o dia que você chegou nesse mundo de luz, som e sentimento? Porque? Se todos os outros dias foram e são mais importantes que ele? Todos os dias que marcaram uma grande passagem na sua existência...todos os dias que você aprendeu alguma coisa importante dessa vida... que te fez mudar de opiniões, de estratégias, que te tornou alguém melhor, que te possibilitou virar a última página de um grande capítulo, que te mudou o rumo. A vida é para ser comemorada vivendo! Quem te ensinou que precisamos comprar um presente sem valor mas que custa uma boa parcela do teu salário? Quem te ensinou que precisamos fazer uma grande festa com mimos e decoração da moda para ficar bem na fotografia? E passei a comemorar as datas dos outros, mas a minha não. A minha, eu comemoro todos os dias quando abro o olho e consigo vencer a mim mesma, eu, minha pior e mais perigosa algoz, eu venço todos os dias a mim mesma, e me levanto, e faço minhas obrigações, e corro e corro e corro.

Ontem foi um dia de shoppings lotados, consumismo feroz, eu também estava lá rsrs...Afinal dessa vez às pessoas realmente se endividam por alguém que realmente merece! Neste segundo domingo de maio, eu já comprei meu próprio presente, o da minha mãe e o da minha sogra. Mas não podia deixar de poetizar a pureza, não da data, mas da maternidade, essa entidade ou coisa inexplicável, que de tão grande e cheia, não consegue caber em nenhuma palavra já inventada sem ser injustamente subdimensionada.

A maternidade caiu na minha vida simplesmente como um rojão devastador, exatamente assim, numa fração de instantes, e eu, ingenuamente, acreditava que estava esperando e planejando e sonhando com ela... nunca! Nunca eu teria a proporção aproximada do que me esperava por trás daquele lençol na sala de cirurgia...vida que eu nutri, vida que chorei e sorri, vida que acalentei e vi crescer e se transformar a cada novo dia. Meu filho me transformou em mãe, e ser mãe me transformou na criatura que eu nunca imaginei ser um dia. Meus planos, se existiam, os vi sendo arrastados por outras vias, e eu fui seguindo a correnteza das novas águas, e eu nunca nadaria contra esta força...

Quando finalmente me vi convencida de que aquele "maior amor do mundo" nunca poderia ser dividido com mais ninguém, veio minha filha pra provar que a mágica poderia ser ainda mais bela e inacreditavelmente arrebatadora: o amor se multiplica sem prejuízo de nenhum mísero grão do sentimento que já existia. E quantos filhos eu tivesse, minha mãe estava certa, eu os amaria da mesma intensidade, sem preferir seletos filhos, o amor é simples e cabe no coração da mãe...Deus há de explicar!

Esta semana, fui às comemorações escolares em homenagem às mães...Curiosamente, foi minha primeira experiência, mesmo meu primogênito já cursando o Fundamental e minha caçula já no terceiro Infantil.  Nos anos anteriores, sempre tinha um motivo maior que me impedia a participação, mas este ano, mesmo sendo inauguração, fui sem pensar em chorar, e chorei...

Chorei com Maria Rita cantando:
"Crescendo, foi ganhando espaço / Pulou do meu braço/ Nasceu outro dia e já quer ir pro chão / Já fala mãe, já fala pai / Já não suja na cama..."
Chorei, porque comigo as coisas não aconteceram exatamente assim como acontece com todo mundo... mas daí, a canção continuou e eu fui chorando mais ...
" Tropeça e seguro e não deixo cair / Se cai, levanta, continua / A porta da rua fechada / Criança não deixo sair" ...
E quando a arte me apresenta a estranheza de ser diferente de todos, e ao mesmo tempo tão igual, depois de passadas pelas mãos as pedras que boleei pelo caminho, veio outro verso...
" É cria, criatura e criador / Cuida de quem me cuidou / Pega na minha mão e guia"...
Daí eu chorei porque a maternidade da minha mãe me trouxe até a minha própria maternidade como uma ciranda de roda realmente, costurada por mãos de várias gerações que se eternizam na invisível herança. Estou aqui com meus dois filhos, minhas mais belas obras dessa vida, minhas duas catedrais em constante processo de construção...
Este é o nosso segredo, que por mais revelado, por maior desejo nosso de repassá-lo nos livros, nas vozes, nunca homem nenhum poderá saber como bate o coração de uma mãe... Parabéns mulher que nasce, parabéns mulher que morre, parabéns mulher que vive! Parabéns ser feminino que carrega um coração do tamanho imensurável, coração materno.