Em 29 de Outubro, não consegui dormir antes de escrever isto:
Hoje fiz um bolo com leite de vaca, como há MUITO tempo eu
não fazia (uns 10-15 anos talvez)...
Amanhã será um dia "D", incomum, não sei se
feliz, se frustrante... mas de certo, será emocionante...
Um dia pra ser previamente avisado apenas para os mais íntimos,
por ocasião de prevenir "maus agouros"...rs Será? Será se existe
gente que deseja infortúnios a troco de inveja ou despeito? Vias de dúvida, melhor deixar quieto, apenas
nas nossas privativas e protegidas paredes, pois tanto que vi nas páginas de
vida que virei, já não me surpreendo com seres humanos.
O importante desta noite é que ela precede meu dia
incomum...nunca pensei que ele chegaria realmente, parecia tão distante e
impalpável...e agora que o tenho tão perto, meu coração vacila, meus olhos
marejam, meus dedos tremem, e minha fé...ah, a minha fé, que já nem sei se é
fé, de tão medrosa que é de acreditar no milagre... fé que, confesso,
fraqueja... fraqueja por força das decepções que suportei...por medo da
felicidade perdida antes de ser sentida, medo de não merecer tanto...
Amanhã, amanhã, amanhã...meu filho, que dorme inocente e
indiferente ao passo que dará, na sua tão recente história, vai ingerir o leite
que fez tanto mal esses anos...depois de quase cinco anos após o primeiro
contato... e eu vou permitir isso, com o coração na mão, e uma coragem que não
sei de onde vou tirar...
Amanhã, queira Deus, espero que eu venha a escrever um
emocionante discurso, aquele que em meus sonhos já escrevi há tanto tempo...
E Ontem, dia 30, eu respondi assim ao meu coração:
Finalmente “hoje” chegou. Não trabalhei, não mandei os
meninos para a escola e cedo organizei nossa bagagem: os últimos exames de igE
feito há 6 meses, o último prick teste de 1 ano atrás, duas caixinhas do suco
preferido, uma fatia do bolo de chocolate feito com leite ninho, uma roupa
sobressalente e minha santinha. De recomendações: nada de antialérgicos nos
dias anteriores, e jejum a partir das 10:00h de hoje. E seguimos para o velho
Hospital Albert Sabin...
De início, realizamos um prick com resultados animadores,
tanto que o bolo continuou guardado na bolsa, e partimos para a provocação
direto com o leite de vaca sem lactose.
As primeiras doses foram oferecidas na seringa, e apenas a
última no copinho, misturadas ao suquinho dele, nessa ordem:
1ª dose: 0,5 ml de leite - Intervalo de 15 minutos;
2ª dose: 2 ml de leite - Intervalo de 15 minutos;
3ª dose: 5 ml de leite - Intervalo de 15 minutos;
4ª dose: 10 ml de leite - Intervalo de 15 minutos;
5ª e última dose: 30 ml de leite a livre demanda.
Decidi não deixá-lo ciente que o que ele estava bebendo era
leite de vaca, pra não correr o risco do fator psicológico desencadear alguma
reação. As primeiras 4 doses foram perfeitas, sem reações visíveis, e terminava
falando "está muito bom!" Mas na última fase do teste, quando o
leite foi oferecido no copinho, ele só aceitou metade da mistura. Chegou um momento
que ele não quis mais, não sei se por conta do cheiro percebeu alguma coisa
(apesar dele não conhecer o cheiro de leite de vaca), não sei se por ter
sentido alguma indisposição ou incômodo na garganta. Começou a tossir, o que me
deixou em alerta, não tirava os olhos dele...foi então que surgiu um
vermelhinho no queixo, que logo se misturou a uma bolinha maior, a pele ficou
grossa...foi o sinal para dar o teste como terminado. Lavamos seu rosto e mãos,
foi medicado com desloratadina e ficamos em observação.
Conclusões sobre sua situação de APLV: Ele NÃO está curado, mas já tolera quantidades mínimas, o que nos deixa tranquilos em
relação aos traços...ou seja, a bucha que lavou a mamadeira da irmã já não
oferecerá riscos a sua qualidade de vida.
O que nossa Alergista me explicou foi que essa
cura realmente não será da noite para o dia, que antes dela existem etapas, e
que o Danilo está numa delas. Já tolera traços... TALVEZ já esteja tolerando TAMBÉM o
leite processado (em alimentos assados em forno por 30 minutos em altas
temperaturas)...e com o passar do tempo seu organismo vai aprendendo a tolerar
quantidades maiores...
Chegou um momento que eu fiz o mesmo questionamento
que talvez você esteja se fazendo agora:
"Até aqui, dra. eu aprendi que eu tinha que
isolar Danilo até do cheiro do leite, e agora de repente isso muda? De repente
quantidades mínimas são permitidas e até incentivadas? Queria muito entender
isso, com segurança..."
E ela me explicou mais ou menos o seguinte:
"Sim, porque alergia é assim, cada criança
responde de uma forma diferente e há o tempo certo de cada coisa...há o tempo
para se isolar, e há o tempo de EVOLUIR"
Eu sei que muitas colegas de luta me
recriminariam pelo teste que fiz...quando estava na sala de espera com Danilo
em observação, com minha santinha fechada na minha mão e o rosto molhado pelas
lágrimas da felicidade que não foi sentida, cheguei a pensar que o certo teria
sido fazer a provocação apenas com o bolo...mas teria sido negativo, e eu
voltaria pra casa achando que ele já devia estar mesmo curado...e por mais que
eu me contivesse quanto aos cuidados de sempre, minha família e funcionária,
talvez relaxariam, e quem sabe algo pior acontecesse em casa...
Enfim, passamos por esta etapa! E na sala de
espera mesmo, eu limpei minha lágrimas, quando olhei em volta.... um menino de
uns 10 anos numa cadeira de rodas; uma menina de uns 7, com uma sonda por
dentro da calça, estirada numa maca; um menininho com uma das pernas
amputadas... E diante disso, eu não me achei no direito daquele choro...eu era uma mãe felizarda,
meu filho apenas tem alergia alimentar, e hoje, já tolera traços e contato de
pele...
E para as mães que sabem de tudo, eu informo:
CONFIO nas médicas que me acompanham... confio nos estudos que se
fazem...confio no meu instinto materno...confio em Deus... Não vou estagnar por
medo, vou evoluir, vou levar meu filho comigo, e vou ensinar a ele que a gente
tem que ter coragem, mesmo se o coração acelerar e as pernas tremerem... nem
tudo é como te disseram até aqui! Reveja seus paradigmas...
Vamos em frente!
Beijos e meus sinceros abraços a quem torce realmente por nós... Obrigada a todos os que vem rezando por todos esses anos, suas orações me emocionam...